29 de jan. de 2011

Para se tornar potência verde, Brasil precisa fazer mudanças na matriz energética

Na atual disputa por uma economia de baixo carbono, o Brasil poderia estar no topo do pódio e permanecer nele por muito tempo devido ao seu vasto potencial de energias renováveis. Mas, segundo especialistas, o país vem desperdiçando oportunidades de explorar fontes de energia limpa --o grande motor para o desenvolvimento em tempos de mudanças climáticas.

"Ninguém tem dúvidas de que as energias renováveis vão dominar no futuro. É um processo muito demorado, mas irreversível", afirma o economista e engenheiro Edmilson Moutinho dos Santos, professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP.

"Mas o Brasil, mesmo com todo seu potencial, pode ficar para trás se não investir mais nessa área de energia verde", alerta o coordenador do Greenpeace, Ricardo Baitelo.

China, Estados Unidos e alguns países europeus estão aplicando bilhões de dólares para expandir suas energias verdes, especialmente eólica, solar e de biomassa (produzida a partir de lixo orgânico e sobras agrícolas, como o bagaço da cana).

Na Europa, por exemplo, do total de novos mecanismos de geração de energia instalados no ano passado, 60% foram para renováveis.

Um estudo do Pew Environment Group com países do G-20 mostrou que, enquanto o investimento da China nessa área foram de US$ 34,6 bilhões em 2009, o do Brasil foi de US$ 7,4 bilhões.

SITUAÇÃO CÔMODA

A culpa dessa "lentidão" do governo pode estar justamente na situação confortável do Brasil, com imenso seu potencial hidrelétrico, que faz com que 47% das fontes de energia do país sejam limpas. No entanto, para os especialistas, esse índice não pode ser visto como um motivo para se acomodar.

"Até há alguns anos, o país ainda tinha um grande potencial hidrelétrico a ser explorado. E o governo alegava que a Europa só investia em fontes renováveis por não ter esse potencial", diz Baitelo. "Hoje, ele já percebeu as dificuldades ligadas a hidrelétricas e as vantagens da energias como a eólica."

Para a professora de gestão ambiental da USP, Neli Aparecida de Mello, o problema não está nas hidrelétricas em si, mas na aposta que sempre se fez nas obras grandiosas, como Itaipu e Balbina, e também na sua localização.

"Não é uma questão de banir o modelo, mas sim de mudá-lo. Em primeiro lugar, deveríamos construir hidrelétricas menores, mais locais", diz. "Também é preciso levar em conta que atualmente os novos projetos estão na Amazônia, como Belo Monte. Além do impacto ambiental, temos de ver o grande problema de logística para controlar essas longas linhas de transmissão que trazem a energia para o Sudeste."

Outro desafio passa pelas emissões vindas do setor energético. A meta do governo é permitir que esse tipo de emissão --hoje representa 16,5% do total-- dobre em dez anos.

Segundo Baitelo, o governo usa a desculpa de que, como as emissões desse tipo são baixas, não há problemas em aumentá-las. "É um absurdo que se permita duplicar esse valor num país como o Brasil, com tantas alternativas energéticas", diz. Deslumbramento.

Os especialistas também apontaram para outro motivo para esse certo atraso do Brasil em investir nas fontes verdes: o pré-sal. "No início do governo Lula, o etanol era prioridade.
Com o pré-sal, houve um deslumbramento e ele acabou sumindo um pouco do discurso", afirma Baitelo, lembrando que o então ministro de Minas e Energia Edison Lobão chegou a dizer que queria ver carros de passeio a diesel.

Santos destaca ainda que essa empolgação pré-sal acabou tirando o foco de uma questão essencial: o destino do gás gerado pela exploração desse petróleo.

A projeção para essas emissões são tão altas que poderiam substituir as geradas pelo desmatamento, se esse fosse erradicado. "Para quem está pensando em sustentabilidade, é um absurdo não aproveitar bem esse gás", diz o engenheiro, acrescentando que, aliado a outras fontes, o gás poderia ajudar no abastecimento de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo.

Outro contrassenso indicado por Santos é não se incentivar ônibus movidos à gás --e sim a diesel e etanol. "Para suprir frotas grandes como a de São Paulo seria preciso plantar muito mais cana, tirando espaço de outro tipo de lavouras."


BBC BRASIL

Um comentário:

Paulo Augusto disse...

Sempre haverá opiniões divergentes a esse respeito. Por exemplo: na Europa, as pessoas que vivem próximas dos geradores eólicos reclamam do barulho constante gerado pela rotação dos héllices; a utilização de biomassa lança calor e resíduos no ar; o uso de gás apresenta os mesmos inconvenientes; enfim, como os medicamentos, todas essas teorias têm efeitos colaterais. Há que optar pele menos pior, mas com espírito público e pensando no melhor para a nação. Importar ou adotar soluções alienígenas é que é inaceitável.